sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Donald Fagen - The Nightfly (1982)


Esse é um dos discos mais sensacionais jamais feitos. Ele é cheio de conceitos, composições belas, obsessivamente executadas, uma verdadeira obra-prima. Mas, você, jovem, poderá se perguntar: quem é Donald Fagen? Bem, ele é 50% do Steely Dan, um grande compositor, letrista, dono de uma das maiores assinaturas sonoras num instrumento. Suas levadas no Fender Rhodes e demais engenhocas tecladeiras marcaram a sonoridade jazz pop americana, nascida de apropriações do fusion, misturado com o funk novaiorquino setentista, além de um discretíssimo gênio.

Em 1982, Fagen e seu parceiro Walter Becker resolveram encerrar as atividades do Dan por tempo indeterminado, após o lançamento de Gaucho, em 1981. Só que Fagen ainda tinha material para um outro disco, coisas muito pessoais, reminiscências da infância, cheias de uma visão terna sobre os tempos idos. Daí nasceu The Nightfly, uma homenagem sincera aos tempos do American Way Of Life e sua paranóia anti-comunista. Além desse conceito principal, Fagen resolveu abordar aquela visão de futuro do passado, dos tempos em que achávamos que tudo seria perfeito no ano 2000. O maior sucesso do disco, "I.G.Y", trata exatamente disso. A sigla quer dizer International Geophysical Year, nome que o ano de 1958 recebeu da comunidade internacional pela quantidade de projetos iniciados com vistas a facilitar a vida das pessoas. Fagen menciona algumas dessas suposições e aproveita para viajar na maionese do tempo. Ele cita coisas como viagens de trem entre Paris e Nova York que durariam 90 minutos, máquinas programadas por gente cheia de compaixão, viagens espaciais, cidades com energia solar, um tempo de liberdade. A visão dele é irônica, mas cheia de saudade de um futuro que nunca chegou a existir.

Em outro momento sublime, "New Frontier", Fagen lista provisões para um abrigo anti-nuclear, indo de discos de Dave Brubeck, comida, cerveja e até mesmo uma loura que se parece com a atriz Tuesday Weld, com sotaque francês. Como ele diz "the key-word is survival on the new frontier". Na verdade, outra crítica mordaz à neura anti-comunista, sob o ponto de vista do povo que se preparou para o fim do mundo como se fosse algo simples. Aliás, "New Frontier" tem um dos clipes mais legais já feitos. Além delas, há o jazz estilizado de "Maxine" e "Ruby Baby", o funk de branco bom de bola da faixa-título, o pop caribenho de "The Goodbye Look", o boogie-woogie de "Walking Between Raindrops" e o pop steelydânico de "Green Flower Street". Tudo perfeito.

O instrumental do disco é um caso à parte. O sujeito recrutou um time de músicos de estúdio, algo que ele fazia já no Steely Dan, e deixou que todos executassem as músicas. Temos o baterista Abe Laboriel, o guitarrista Steve Lukather, o baixista Marcus Miller, o baterista Jeff Porcaro, entre muitos.

Nightfly é um marco atemporal da música pop. Seu som não pode ser enquadrado em nenhuma década. Ele é moderno demais para os anos 50, avançado demais para os anos 60, afiado demais para os 70 e está anos-luz à frente de tudo que se pensou em fazer a partir dos anos 80. Ouso dizer que apenas Ry Cooder em suas narrativas musicais pessoais sobre sua infãncia em Los Angeles é tão relevante quanto Donald Fagen. Brilhante.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Pulp - His'n'Hers (1994)

Quando você pensa em britpop, a imagem de Oasis e Blur em 1994 é o que a mente te mostra, certo? Muita gente se esquece do Pulp quando fala de britpop e isso é muito injusto, pois o grupo de Sheffield foi responsável por três discos lançados entre 1994 e 1997, que podem sintetizar esse tempo de efervescência cultural britânica.

Liderado por Jarvis Cocker, o Pulp começou suas atividades no final da década de 1970, mais precisamente em 1978, tendo gravado seu primeiro disco, It, em 1983. A banda ficou 11 anos amargando o underground até lançar His'n'Hers, um disco sobre sua cidade, pautado pelas visões irônicas e críticas que Jarvis possuia (e ainda possui) sobre a vidinha fútil das pessoas, principalmente sobre as reações delas diante da descoberta do sexo, das drogas e tudo mais.

Poderíamos dizer que His'n'Hers é quase um disco "adolescente" do Pulp, não que isso signifique uma obra ensolarada e pra cima. Tendo as fases setentistas de Roxy Music e David Bowie, além dos primeiros discos do Cure como inspiração, o Pulp forjou uma espécie de pós-pós-punk, voltado para a Inglaterra, no melhor estilo dos já mencionados Oasis e Blur, fazendo o mesmo em Manchester e Londres, respectivamente. A diferença é que as letras de Jarvis Cocker são, seguramente, as melhores surgidas em todo o britpop.

Canções como "Babies", "Do You Remember The First Time" e "Acrylic Afternoons" já mostram as dificuldades em lidar com o amor, o sexo e enquadrá-los na perspectiva "correta". "David's Last Summer" é um épíco informal sobre a despedida da adolescência e de toda a inconseqüência confortável que ela pode proporcionar, enquanto "Lipgloss" é um convite nerd para a pista de dança escura e úmida.

Os discos seguintes da banda, Different Class (1995) e This Is Hardcore (1997) já mostram o Pulp em Londres, lidando com a fama e tudo que ela pode trazer de bom e ruim. Foi, no entanto, em His'n'Hers que os mais cínicos participantes do britpop se mostraram mais vulneráveis.

Huey Lewis And The News - Sports (1983)


Toda década tem suas grandes bandas, seus fiascos, seus erros e acertos. Ao lado desses destaques, toda década também tem suas bandas ocultas, subestimadas, pequenas, one-hit wonders, aquelas formações que não aparecem em listas, não mudam nada em termos de comportamento e tendência, mas que sempre emplacam um ou mais hits certeiros nas paradas.

É o caso dessa formação de San Francisco, da qual, mui provavelmente, você não ouviu falar ou pensava ser apenas a responsável pela manjada e simpaticissíma "The Power Of Love", tema do filme De Volta Para O Futuro e suas seqüências. Em 1983, dois anos antes do estouro do filme, Huey Lewis e sua banda entraram em estúdio para dar forma ao que seria seu terceiro disco.

Ainda meio sem noção do que fariam, os sujeitos começaram a compor canções ganchudas, extremamente pop, cheia de guitarras crocantes e expansivas, sob influência de bandas como Cars e Pretenders, talvez com um toque leve de Bruce Springsteen. Começaram a fazer sucesso com "The Heart Of Rock'n'Roll", uma espécie de roteiro de viagens sob o ponto de vista de Lewis, ainda que eles jamais poderiam ser chamados de uma banda "de rock".

Eminentemente pop, o disco - batizado Sports - subiu nas paradas americanas e lá ficou, ajudado pelo estouro mundial da melhor canção jamais feita pelos News: "Heart And Soul". Com um arranjo que traz guitarras e teclados marcando um riff grandioso, a canção tornou-os conhecidos via MTV. "Heart And Soul" é uma dessas jóias pop, que nascem quase por geração espontânea, uma delícia de pouco mais de três minutos.
Três anos depois eles gravariam Fore, fraco, se comparado com Sports, ainda que tivesse o sucessinho de "Stuck With You", incluída na trilha sonora da novela Hipertensão, se não me falha a memória.

Huey Lewis ainda se arriscou como ator em Duets, contracenando com Gwyneth Paltrow, cantando versões karaoke de "Cruisin'" (Smokey Robinson) e "Lonely Teardrops" (Jackie Wilson), não fazendo feio. Seu ouro, porém, está em Sports.

Detalhe: vejam o clipe de "Heart And Soul" e reparem numa iniciante Sharon Stone, fazendo par romântico com Huey.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Ben Folds Five - Ben Folds Five (1995)


Falar sobre esse disco é lembrar de um tempo em que eu garimpava novidades nas lojas do Rio de Janeiro. Veja, nunca foram muitas lojas, mas a Spider, localizada numa galeria em Ipanema, tem lugar cativo na memória. Ali eu ouvi Oasis pela primeira vez, comprei minha cópia de Parklife (melhor disco do Blur) e conheci o Ben Folds Five. Por acidente, diga-se.

Eu havia ido até lá para comprar What's The Story Morning Glory, o segundo disco do Oasis, mas as cópias - encomendadas da Inglaterra - ainda não haviam chegado. Com a mão coçando por algum disco novo, pedi para dar uma olhada no que havia na prateleira. Lá estava um single com a música "Underground", tendo "Sports And Wine" como lado-B.

A banda era totalmente desconhecida pra mim, mas a capa do single - verde - me despertou a curiosidade. Pedi para ouvir e fui imediatamente fisgado. Que piano era aquele? Que gente estranha era aquela, com vocais em falsete, levadas de semi-jazz misturado com pop perfeito, tudo como se Elton John e Billy Joel aparecessem disputando uma corrida de skate num bowl ensolarado?

Fiquei atônito e comprei o single imediatamente, saindo da loja para um dia de sucessivas audições. À noite, na sacrossanta Faculdade de Comunicação da Uerj, apresentei a novidade a meus amigos, que foram imediatamente capturados pela magia do Ben Folds Five. Falei deles na Revista Rock Press, na faculdade, comprei seu disco completo na própria Spider alguns dias depois - deixando o Oasis para mais tarde - e me deparei com mais canções perfeitas: "Julianne", "Jackson Connery", "Uncle Walter", "Boxing", "Where's Summer B?" e a melhor de todas, "Philosophy".

Com Ben Folds no piano, Robert Sledge no baixo e Darren Jassee na bateria, a banda não tinha guitarra, muito menos cinco integrantes como o nome sugeria. Além disso, os malucos - todos da Carolina do Norte - estavam debutando com esse disco fabuloso, mais nerd que o Weezer, mais talentoso que quase todo o pop noventista americano - sem exagero. Ouvir esse disco é uma obrigação para você, leitor. Ben Folds Five é sensacional.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Pet Shop Boys - Behaviour (1990)



O início da década de 1990 foi um tempo estranho. Enquanto o rock alternativo ainda não conseguia a visibilidade que o movimento grunge traria um ano depois e os megastars ainda grassavam pela Terra, este duo inglês fez um disco praticamente perfeito.

Neil Tennant e Chris Lowe já estavam no quarto trabalho, capitalizando singles nas paradas de sucesso em seqüência e travavam um simpático duelo com o New Order pela hegemonia da cena dance-house-tecno-whatever. A disputa entre a banda de Manchester e os PSB parecia mais uma treta criada pela imprensa inglesa, mas, na verdade, Introspective (1988) dos Pet Shop Boys acabou engolido por Technique (1989) do New Order.

A "resposta" viria com Behaviour, um disco que colocaria no bolso o trabalho seguinte do New Order, Republic, principalmente pela coesão que trazia. Desde 1985 os PSB perseguiam um modelo musical único no cenário pop: eram blasés, esclarecidos, cultos, gays, capazes de conjugar influências dos anos 60 - a cantora inglesa Dusty Springfield chegou a cantar com eles no segundo disco, Please (1986) - de uma forma quase tão intensa quanto Morrissey fazia nos Smiths. Só que os PSB nunca deixaram isso atrapalhar a persiguição do esquema perfeito da canção: chique, elegante, precisa, luxuriante.

Fizeram isso em todos os antecessores de Behavior, mas foi nele que atingiram o topo. O single "Being Boring" permanece como um dos maiores acertos do pop desde sempre, cheio de cordas (arranjadas pelo maestro Angelo Badalamenti), guitarras serpenteantes e samplers tecladeiros de harpas, vocais, coros, tudo a favor da canção. O clipe da música adentrou as MTV's do mundo com sua estética p&b, trazendo a celebração da juventude no proverbial "último dia do resto de suas vidas", celebrando o rito de passagem para a vida adulta, tão bem descrito pela letra de Tennant, cantando bem como nunca.

Em outro momento do disco, mais precisamente em "How Can You Expect To Be Taken Seriously", a banda se vale de batida característica da época - talvez criada por Jazzy B e seu Soul II Soul um ano antes - e empresta tédio à crítica mordaz aos artistas que fazem caridade e se aproeitam da imagem. Brilhante. A versão do clipe é diferente da que o disco traz, o que me levou a uma busca incessante, resolvida anos depois. A canção em sua variante 7" Perfect Attitude Mix foi perseguida por mim por bastante tempo, mais sutil e climática que a versão do disco, com alguns riffs de guitarra que parecem meio fora de lugar.

Behaviour é um disco que mostra um mundo em transição, sem internet, celular, no qual o fax e o telex eram o máximo em comunicação. Estranho, mas real.

domingo, 26 de outubro de 2008

Style Council - Confessions Of A Pop Group (1988)


O que um disco pode ter de tão ruim para fazer um artisa consagrado como Paul Weller perder o contrato com uma gravadora? Na verdade, Confessions Of A Pop Group não fez Weller e seu Concílio de Estilo perderem o vínculo com a Polygram, mas abalou sua credibilidade a tal ponto que os colocou na posição de um grupo iniciante. A tal quebra de contrato viria com o disco seguinte, Modernism: A New Decade, no qual eles abraçariam a acid house com três anos de atraso e sob a visão elitista e "esnobe" que Weller forjara ao longo dos anos 80.

O Style Council foi uma excelente banda, não entendam mal. Apenas estava no momento errado, talvez. A história você já sabe: Weller, cansado dos anos punk à frente do Jam, desmanchou sua banda original e montou um duo com o tecladista Mick Talbot, no qual exploraram terrenos musicais não mapeados, ou seja, a bossa nova de gringo, o sambinha de branco e, claro, o soul e o funk estilizados.

Falando assim até parece que o Style Council era horroroso. Nada disso, apenas era pomposo demais, cheio de uma fleugma meio falsa, mas, por trás disso tudo, Weller parecia se divertir com as pessoas e aproveitava para exercitar sua verve de compositor, se aventurando por suítes de piano e decalques de soul. Na carreira de quatro discos, entre 1984 e 1988, são soberbos Our Favourite Shop e Cafe Bleu. Já Cost Of Loving e Confessions Of A Pop Group estão no lado de baixo da tabela.

Injustiça, ainda mais se passarmos os discos pelo filtro do tempo. Esse trabalho, que eu tinha em LP, é um belo momento do pop orquestral, cheio de pianos e com uma bela performance vocal de Paul Weller. A abertura com "It's A Very Deep Sea" é um exemplo do que o disco oferece. Talvez a implicância maior com o Style sempre tenha vindo de críticos órfãos do Jam e incapazes de se emocionar com boa música pop. "How She Threw It All Away" também é bem bonitinha. Agora, os momentos pianosos de Talbot são como se Richard Clayderman tivesse passado pelo estúdio e apertado o "rec" enquanto o tecladista oficial estava no banheiro.
O maior acerto desse trabalho é "Changing Of The Guard", uma bela canção pianística, com uma boa participação vocal de Dee C. Lee, que foi, durante um bom tempo, a Senhora Weller.

Perca o preconceito e ouça.

sábado, 25 de outubro de 2008

Cat Stevens - Buddha And The Chocolate Box (1974)


Poucas coisas na música pop me incomodam tanto quanto o esquecimento das carreiras de Cat Stevens e James Taylor por parte dos mais jovens. Aliás, os mais jovens têm uma memória cada vez mais curta, porém, talvez isso não seja culpa apenas deles, mas da mídia e todo o sistema que a gente já conhece e enfrenta. O que importa é que os discos de ambos sempre estarão disponíveis para atrasadinhos em geral. Veja, nada contra as pessoas atribuírem a existência do folk rock aos Byrds, Dylan e Crosby, Stills, Nash And Young, mas, o conjunto de álbuns gravados por Cat Stevens entre 1970 e 1978 contém achados inestimáveis, capazes de credenciá-lo a um posto de destaque na linhagem.

A grande diferença entre Steve Demetre Georgiou (filho de um cipriota com uma sueca, nascido em Londres) e os americanos folksters é que ele tinha, digamos, muito mais tesão no jeito de cantar e compor que seus colegas de ofício. Além disso, Cat tem em seu currículo uma coleção de hits que partem do folk (de Dylan, principalmente) e se incorporam a toques orientais, pop da melhor qualidade e uma gana de cantar como se a vida dele dependesse disso. Assim foi desde a estréia, com Matthew And Son (1968) até o disco de despedida Back To Earth (1978), inaugurando um período em que Cat se tornou Yussuf Islam, convertido ao islamismo e retirado do mundo fácil do showbiz. Ele voltaria em 2006 com um disco inestimável - que passou quase despercebido da maioria, An Other Cup - no qual recupera muito de sua verve e jeito peculiar de cantar.

Em Buddha... Cat estava experimentando um período de entressafra, muito por ter ousado no trabalho anterior, Foreigner, cheio de composições enormes, em forma de suítes folk-prog, que jogaram contra seu status de hitmaker. Seus discos Mona Bone Jakon (1970), Tea For The Tillerman (1970) e Teaser And The Firecat (1971) colocaram o sujeito na proverbial crista da onda. Em 1974 ele voltaria às paradas com o sucesso de "Oh, So Young" e alguns hits menores, sobretudo "Home In The Sky" e a sensacional "C-79", além de iniciar um interessante intercâmbio com músicos brasileiros. O percussionista Chico Batera seria convocado para sua Earth Tour, de 1976, e o próprio Cat, além de adquirir uma casa no Rio de Janeiro, participaria de Gil & Jorge, (maravilhoso disco de Gilberto Gil e Jorge Ben, no qual ouve-se Gil gritando em alguns momentos: "vai Gato Estêvão, vai Gato Estêvão!!!!). Milton Nascimento ganharia uma bonita homenagem em Back To Earth, "Nascimento", canção na qual participa com suas famosas vocalises.

Cat Stevens é um pequeno gênio, um grande achado. Ouça.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Simon and Garfunkel - Bridge Over Troubled Water (1970)


Simon e Garfunkel já não eram exatamente puristas do folk quando se reencontraram em 1964, após o fim de seu duo anterior, Tom & Jerry. Simon, principalmente, era um tarado por boa música pop e excelente músico. O produtor Tom Wilson, o sujeito que ajudou Bob Dylan a eletrificar o folk e mudar praticamente tudo o que se fazia no estilo, resolveu empreender uma pequena cirurgia em uma das canções de S&G, "The Sounds Of Silence". O resultado, após o acréscimo de guitarras elétricas, baixo e bateria, subiu como um foguete nas paradas de sucesso e deu novo ânimo à estréia da dupla, Wednesday Morning, 3 A.M., de 1965, que não havia causado grandes efeitos quando de seu lançamento.

Simon & Garfunkel pavimentaram uma estrada de lindas melodias e letras simbolistas. Após o lançamento de Paisley, Sage, Rosemary And Thyme em 1966 e de seu provável melhor disco, Bookends, de 1968, a dupla já era capaz de atingir o melhor de dois públicos. Considerados "bobos" pela juventude idealista hippie, S&G ainda eram capazes de conquistar fãs nas alas "moderadas" dos apreciadores da psicodelia. Além disso, as músicas doces e belas eram talhadas para agradar ao apreciador médio de música pop. As pessoas que ouviam música e não pretendiam mudar a história a partir desse ato.

Em 1970 tudo indicava que a parceria chegara ao fim. Garfunkel, dizem, se sentia inferiorizado diante do talento de seu companheiro, algo que não é totalmente mentira. Simon evoluiu no estúdio a tal ponto que pode ser comparado com os melhores produtores do pop, uma fração abaixo de gente como Brian Wilson, sem qualquer exagero. O exemplo desse talento está no último disco que a dupla gravou, Bridge Over Trouble Water. Além da canção título, gravada até por Elvis Presley, o disco trazia sucessos como "Cecilia", "The Boxer" e uma impressionante canção andina chamada "El Condor Pasa".

Mas o grande momento musical desse disco é "The Only Living Boy In New York", justamente pela subjetividade e pela declaração de amor velada a tempos idos, no momento em que há percepção total do presente se tornando futuro. Mesmo que Simon e Garfunkel tenham seguido carreiras solo - e que o sucesso de Simon apenas confirme o talento que ele sempre teve - os dois se encontraram em 1981 para um concerto comemorativo no Central Park. Dali haveria um disco de material inédito a ser gravado, abortado. Simon lançaria o subestimado Hearts And Bones um ano depois e daria seu grande salto para frente, a bordo do ambicioso Graceland (1986), quando foi até a África do Sul para gravar com músicos locais.

Voltando a 1970. "The Only Living Boy In New York" é um "até logo" a Garfunkel, diante da inevitabilidade dos fatos. A letra mostra que "o único rapaz vivo em Nova York" é Simon, após o fim da amizade dos dois, algo que nascera ainda no ginásio. O sentimento de solidão, de resignação e de enfrentamento do futuro que chega é palpável na canção. O arranjo que a dupla fez, com vozes que simulam os cantos de corais infantis - dos quais Garfunkel emergiu - são uma obra-prima da produção pop.

Gravadas numa câmara de eco, as vozes foram multiplicadas por 15 e são colocadas em fade, dando a impressão de uma despedida longa e sofrida. Há menções explícitas a Garfunkel, principalmente nos versos iniciais: "Tom, catch your plane ride on time /I know you're part will go fine /Fly down to México /And here I am /The only living boy in New York", onde "Tom" é o antigo nome de Art na primeira dupla que tiveram e a viagem ao México é uma alusão ao filme Ardil 22, no qual o parceiro atua.

Audições mais atentas da música ainda deixam transparecer nitidamente uma influência dos climas finais dos Beatles, talvez do crepúsculo da carreira dos fab four em Let It Be e Abbey Road. "The Only Living Boy In New York" é uma das mais belas canções sobre amizade e cumplicidade já feitas, sob o ponto de vista da tristeza, inferiorizada pelo tamanho do mundo e das coisas, mas capaz de levantar e seguir em frente. Paul Simon, nesse momento, conseguiu ser exatamente o que sua canção queria dizer. Ou seria o contrário?

Snow Patrol - Eyes Open (2006)


O quarto disco dessa banda escocesa é uma pequena e inesperada maravilha. O Snow Patrol pertencia à gravadora Jeepster, que ficou famosa com o lançamento do Belle & Sebastian para o mundo. Dava a impressão que os outros artistas da gravadora seriam igualmente fofos. Erro.

Apesar dos dois primeiros discos, Songs For Polar Bears (1998) e When It's All Over We Still Have To Clear Up (2001) não terem uma cara definida e penderem para as melodias docinhas e ingênuas do Belle, foi no terceiro disco, Final Straw (2004), não por acaso o primeiro trabalho para a Universal, que o Snow Patrol mostrou identidade própria. A verdade é que a banda incorporou uma saudável moldura rock noventista para seu som semi-folk. Onde antes apenas haviam emulações de Nick Drake e Donavan, passamos a ter uma interessante mistura com psicodelia de Flaming Lips, Mercury Rev e um grande toque do U2 pós-Zooropa.

Essa liga funcionou com perfeição definitiva em Eyes Open. Pelo menos três canções são irrepreensíveis: "Chasing Cars" e seu clímax claustrofóbico contínuo; "Open Your Eyes", com sua explosão guitarreira final e a melhor, mais tocante e derramada canção de arrependimento dos últimos tempos, a lullaby "You Could Be Happy". Nela o vocalista Gary Lightbody canta com resignação inevitável sobre um amor que se acabou e recorda detalhes do momento final.

O mais sincero de tudo é o tom otimista da música, na qual Lightbody deseja o bem da ex-amada e dá conselhos para não hesitar nas decisões ou conquistar o mundo, mesmo que ele não esteja mais ao seu lado. Talvez por esse retrato sincero do amor, que contempla raiva e saudade, ódio e semi-amor, carinho e pasmo, que esse disco do Snow Patrol seja tão importante pra mim. Fora isso, deixando o umbigo de lado, é um senhor disco de rock.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Mick Jagger - She's The Boss (1985)


O primeiro trabalho solo de Mick Jagger não é grande coisa. Mesmo que uma constelação de músicos faça parte dele. De Herbie Hancock a Jan Hammer. De Nile Rogers a Jeff Beck. De Sly & Robbie a Bill Laswell. De Pete Townshend a Carlos Alomar, só feras. Mas nem tudo aqui é ruim.

Mick vinha da turnê de Undercover, disco dos Stones de 1983. Resolveu gravar com gente diferente, fazer algo mais pop e sem a cobrança habitual sobre um trabalho de sua banda original, ainda que pareça óbvia uma cobrança maior sobre um dos integrantes a lançar seu primeiro disco longe dos companheiros. E depois disso lançaria Dirty Work, tido por muitos como o pior disco já lançado pelos Rolling Stones.

Por isso She's The Boss foi massacrado pela crítica, apesar do sucesso do single "Just Another Night". Eu gosto dessa música e acredito que ela renderia um rockão se fosse relida nos dias que seguiram. A bateria parece uma linha de montagem industrial, mas o groove é legal e Mick aparece em forma. "Lucky In Love", como ressaltou um fã de Stones acima de qualquer suspeita hoje mesmo, é uma canção pop acima da média para o que era feito na época.

É bom lembrar que, em 1985, os sintetizadores e as sonoridades mais plásticas e anacrônicas (hoje, claro) eram moda. Ouvir discos desse tempo é um exercício de amor à arte e, numa percepção desencanada, pode render boa diversão.

O clipe de "Just Another Night" (rodado no Brasil) trazia Mick dando uns pegas na atriz Rae-Dawn Chong, meio americana, meio tailandesa ou algo assim. Ela é a coadjuvante de Arnoldão Schwarzenegger no abominável Comando Para Matar. A história envolve putaria, exotismo tropical e um gringo no epicentro de tudo. Bem ao estilo do velho lábios de borracha.

Mick só faria um trabalho digno de sua persona rocker em 1993, quando gravou Wandering Spirit.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

David Bowie - Station To Station (1976)


Por incrível que pareça, não é tão fácil gostar de um cara com uma carreira tão extensa e gloriosa quanto Bowie. Pelo menos pra mim. Durante um bom tempo ele foi alvo da minha curiosidade, daquela forma: "o que esse cara tem de tão genial assim?". Bem, isso foi lá pelos anos 80, quando comecei a ouvir música decentemente.

Naquela época eu gostava de "Let's Dance" (a música) e "Blue Jean" (faixa presente em seu disco de 1984, Tonight) de uma maneira mediana. Mesmo lendo maravilhas sobre Bowie e seu trabalho multifacetado, o click não acontecia. Até que ouvi Station To Station e fiquei assombrado. Como era possível encher um disco de tanta informação e elementos não-musicais daquela forma? E quem era esse tal de Thin White Duke, uma das personas de Bowie, que assumia para si a autoria e a responsabilidade por um disco tão claustrofóbico.

Station To Station é um disco de transição, talvez o melhor com essas características jamais feito. Provavelmente Bowie não imaginava isso pro álbum, mas, ele antecipou sua famosa trilogia berlinense, na qual ele gravou Low (1977), Heroes (1977) e Lodger (1979), três monstros musicais que apontam para todas as direções possíveis, mesclando eletrônica, pop, futuro, passado, concepções avançadas e olhares retrô para tudo que poderia ser feito. Sem exageros.

Pois bem, Station To Station é o vislumbre disso tudo. A sua percepção e entendimento melhoram se o disco for visto como o ponto de partida para o vôo mais alto de Bowie.
Aqui estão músicas como "Stay" (sua introdução "whitexploitation"), "TVC15" e a maravilhosa "Golden Years", mais um rescaldo saudosista do trabalho anterior, Young Americans (1975), banhado de soul de branco.
Station To Station, a música, tem dez minutos de duração, tempo suficiente para Bowie desfilar um palavrório sobre totalitarismo, cocaína, esgotamento pessoal e flertar com o futuro de livros como 1984 (George Orwell) ou Admirável Mundo Novo (Aldous Huxley).

Station To Station é muito mais que um disco.

domingo, 19 de outubro de 2008

Neil Young - Comes A Time (1978)


Sei muito bem que o filé mignon da produção de Neil Young está em seus álbuns da virada das décadas 60/70 ou, quem sabe, nos trabalhos do início dos anos 90. De qualquer forma, Comes A Time não é um disco considerado indispensável por críticos de música ao redor do mundo, talvez sua importância seja mais observada pelos sucessos pop que gerou, "Lotta Love" e a faixa-título.

Críticos nem sempre estão certos. Comes A Time é um disco praticamente perfeito na carreira de Neil. Ele vinha de um período negro, livrando-se de drogas e superando a morte de Danny Whitten, guitarrista de sua banda de apoio, Crazy Horse. Mesmo que esse tempo tenha trazido obras-primas como On The Beach (1974) e Tonight's The Night (1975), Comes A Time é o momento em que o artista quase volta pra casa, que, numa interpretação nem tão forçada, poderia ser entendida como uma volta a si, aos sentidos e ao mundo.

Young retomava a seqüência acústica de Harvest (1972) e se esbaldava naquela sonoridade híbrida de country e folk que ele tão bem domina, levada à perfeição em "Look Out For My Love" e, principalmente, nas já citadas "comes A Time" e "Lotta Love". Esta última ainda ganhou uma versão soft rock da vocalista de apoio de Young na época, Nicolette Larson, que emplacou o Top 10 americano.

Este disco, além de seu valor artístico, é, para mim, a iniciação ao culto do véio canadense. Foi o primeiro trabalho que ouvi e que me conquistou totalmente. Dá saudade dos tempos em que os discos queriam dizer mais do que, simplesmente, música.

sábado, 18 de outubro de 2008

Four Tops - Ultimate Collection (1997)


Em algum momento da década de 1980 eu ouvi "Baby I Need Your Lovin'" e fiquei absolutamente louco. A música era perfeita: melodia, harmonia, letra e os vocais. Tive certeza que era um grupo negro americano. Naquela época eu começava a ouvir música com uma atitude, digamos, mais séria.

Descobri os Four Tops e, a partir deles, vieram Temptations, Marvin Gaye, Smokey Robinson, Stevie Wonder e todos os gênios da gravadora mais famosa de Detroit, USA. A soul music, meus amigos, é algo muito sério. Com o tempo fui percebendo, à medida que me apaixonava para sempre pelo estilo, que soul é tão importante quanto a vida e, ouso dizer, maior que ela.

Muitos de meus heróis da música já morreram e, quando olho para o mundo e percebo que muitos deles estão velhos, esquecidos por uma mídia e um público desinformados e rasos, fico um pouco triste.

A solução é ouvi-los sempre, não importa o que aconteça. Digo isso porque ontem morreu o lead singer dos Four Tops, Levi Stubbs. Já estava velho e doente, provavelmente descansou e foi engrossar as fileiras da grande banda musical celeste, cada vez mais cheia de astros, afinal, astros ficam no céu, não?

A escolha da Ultimate Collection para ilustrar o post é prática, uma vez que estão nela 25 músicas do melhor período dos Four Tops, entre 1963 e 1972, sobretudo até 1968, época em que o trio de compositores Holland-Dozier-Holland deixou as fileiras da Motown. São deles "Baby I Need Your Lovin'", "Reach Out (I'll Be There)", "I Can't Help Myself", "It's The Same Old Song", "Walk Away Renee" e tantas outras canções perfeitas, verdadeiros caminhos para novos velhos bons momentos.

RIP, Levi.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Van Morrison - Common One (1980)


O mestre irlandês do folk celta passou a década de 1970 oscilando entre grandes sucessos e momentos de introspecção total. Common One é um dos seus discos mais difíceis, líricos e belos, principalmente por refletir claramente a sua busca pessoal pela espiritualidade.
Van sempre foi um cara obcecado pela transcendência, mostrou isso em vários de seus 38 discos e talvez tenha chegado muito perto nesse Common One.

O revestimento musical é o jazz e as paisagens plácidas da Irlanda do Norte. Mesmo sendo um disco tranquilo, as canções trazem elementos inegáveis de música negra americana, a outra grande paixão do homem.

Fraseados de metais em brasa, típicos de bandas como Harold Melvin & The Bluenotes ou Manhattans, surgem por todos os lados em "Wild Honey". Aliás, o homem que manuseia o saxofone por aqui é, nada mais nada menos que Pee Wee Ellis, escolado nos ritmos negros via James Brown. Um baixo jazzy, pulsante e suingado, além de cordas belíssimas pontuam as mudanças de andamento ao longo dos 15 minutos de "Summertime In England", uma das mais belas canções compostas por Van Morrison.

Outra suíte enorme, "When Heart Is Open", encerra os trabalhos. Muita gente não entendeu como um disco de Van Morrison poderia ter 6 canções e durar mais que 54 minutos, uma média de quase dez minutos por música. Enfim, o tempo deu a Common One o crédito que merecia. A reedição remasterizada lançada nesse ano traz a arte original do disco e duas faixas bônus, versões alternativas de "Haunts Of Ancient Peace" e "When Heart is Open", aumentando a duração para mais de 70 minutos.

Progressivo folk-celta? Não, mais um belo e inspirado disco de Van Morrison.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Grant Lee Buffalo - Fuzzy (1993)

Grant Lee Phillips era uma guitarrista que amava REM, John Lennon e David Bowie em escalas quase iguais. Dono de uma voz celestial e de uma criatividade exuberante, Grant começou cedo a querer ter uma banda de rock. Encontrou em Paul Kimble e Joey Peters os contrapontos perfeitos para suas ambições artísticas. Sob o clássico formato de baixo, bateria e guitarra, mas contando com esquisitices como o domínio de Kimble sobre o piano e a chamada pianola (aqueles pianos dos saloons americanos), o já batizado Grant Lee Buffalo despontou para a mídia em 1993. Após um dos primeiros shows, o selo Slash Records, distribuído pela Warner, assinou com a banda e levou-a para o estúdio a fim de gravar sua estréia.

"Fuzzy" nasceu como uma espécie de declaração de intenções do grupo diante do objetivo implícito por parte de Grant de recriar climas e sons remetentes a uma América mitológica, cheia de peregrinos do Mayflower, lendas do sul do país, cowboys empoeirados, o assassino de Abraham Lincoln, John Booth e até gente como Al Capone. Para isso, o instrumental oscila numa espécie de fio da navalha em que interagem punk, flok, country, psicodelia e o tão chamado “novo”, contido em algum lugar entre os timbres da voz de Phillips e o clima criado.

"Fuzzy" começa arrasador com "The Shining Hour", levada com pinao anos 30 e permeada por letras surrealíssimas, em que versos etílicos como "it kills me to think that I´m no longer living, just looking for excuses to drink" convivem com loucuras como "I propose a toast to the memory of the horse who carried King Tut and his gold... into the sun". Uma das mais perfeitas baladas do pop vem em seguida, "Jupiter and Teardrops", narrando o amor impossível entre um artista mambembe e uma ex-presidiária. Em certo momento Grant faz um trocadilho perfeito com o nome Teardrop e uma das mais lindas canções dos anos 50, "Lonely Teardrops", do Elvis negro Jackie Wilson, que toca no rádio enquanto a ação se desenrola.

As alegrias prosseguem em "Stars’n’Stripes" na qual o cenário desolado de um ferro velho serve de metáfora para uma grande cidade e principalmente em "Dixie Drugstore", que fala do amor entre um casal de fantasmas em Nova Orleans em meio a vocais que murmuram "jambalaya" (uma saudação típica do Sul), cantados pelo próprio Grant com falsete de fazer inveja aos grandes mestres da soul music.

"Fuzzy" levou o Grant Lee Buffalo ao sucesso, mais na Europa que nos Estados Unidos, mas a banda nunca repetiria o arraso de sua estréia em seus três discos seguintes, "Mighty Joe Moon" (1994), "Copperopolis" (1996) e "Jubilee" (1999). Neste mesmo ano Grant deixou-a após uma turnê na Austrália em decorrência de problemas contratuais com a Warner e embarcou em uma belíssima carreira solo, que já conta com o maravilhoso "Ladie’s Love Oracle", lançado em 2000 pelo minúsculo selo Magnetic Fields. Em fevereiro de 2002 foi lançado (lá fora, claro), "Storm Hymnal - Germs From The Vault of" - Grant Lee Buffalo", coletânea dupla que tem seu maior atrativo no cd 2, contando com vários b-sides e raridades, incluindo uma versão acústica de "The Shining Hour".

"Fuzzy" foi inexplicavelmente lançado no Brasil em 2000 pela Warner (com sete anos de atraso). Numa década que teve medalhões como "Nevermind", "Bloodsugarsexmagic", "Automatic For The People", entre outros discos mais emblemáticos, "Fuzzy" passou por uma elegante discrição que acabou fazendo com que adjetivos como perfeito, belo, consistente e pungente só tenham sentido se forem usados em conjunto para definir a sua real dimensão.

OBS: texto publicado anteriormente no site www.screamyell.com.br

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Bryan Adams - Waking Up The Neighbours (1991)


Engraçado. A trilha sonora da maioria das pessoas em 1991 é um mix de Ten (Pearl Jam) com Nevermind (Nirvana). Mas, todos na casa dos trinta e tantos anos reconhecerão a intro de "(Everything I Do) I Do It For You", tema de Robin Hood, estrelado por Kevin Costner.

Ela está nesse bom disco do mesmo ano do estouro do grunge, quase um representante de um outro mundo, muito distinto e distante do flanelão alternativo de Seattle. Não é ruim porque é lento, tradicional, baladeiro e partidário do rock de arena que, na época, fora ultrapassado pelo grunge e jogado fora no lixo da breguice.

Waking Up the Neighbours trazia "Everything I Do" e seus gloriosos seis minutos e tanto de midtempo. A canção ficou no topo das paradas americanas por sete semanas consecutivas. Isso não é surpresa para quem conhecia o talento de Bryan Adams para baladas derramadas. O sujeito já havia emplacado "Heaven" (faixa de seu disco Reckless, de 1984) nos dois lados do Atlântico e ainda cravaria vários outros sucessos do mesmo nível.

Muita gente nem lembra de Adams hoje em dia e, sinceramente, ele nunca chegou a ser um grande artista, mas sua capacidade de pegar o mais açucarado rock de arena e emplacá-lo nas paradas e trilhas de novela sempre foi seu forte.
Outros hits dele, frequentadores assíduos dos programas de flash-back das FM's: "Have You Ever Really Loved A Woman", "Can't Start This Feeling We Started", "Somebody", "Please Forgive Me" e "All For Love", em trio com Sting e Rod Stewart.

Bryan ainda está na ativa, lançou um disco no mesmo nível de Waking... neste ano - 11 - e segue em sua dobra temporal, cantando suas baladas para gente na meia-idade. As músicas do cara, ao fim das contas, lembram namoradas, outros tempos e festinhas nas quais ainda tinha a famosa "hora da música lenta". Isso acabou...

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Bryan Ferry - Boys & Girls (1985)


Se um disco pode ser luxuoso, chique e cheio de maravilhas ocultas, ele atende pelo nome de Boys & Girls.

O quinto trabalho solo de Bryan Ferry (mentor do genial Roxy Music) trazia uma constelação de astros do pop/rock, com destaque para as guitarras de David Gilmour (Pink Floyd), Nile Rogers (Chic) e Mark Knopfler (Dire Straits), o baixo de Tony Levin (da banda de apoio de Peter Gabriel), a bateria de Omar Hakin, o multi-instrumentista Marcus Miller, entre outros.

Ferry chegava ao ápice de sua proposta estética, um processo que ele iniciara ainda no Roxy Music, principalmente a partir de 1977, quando lançaram seu quinto álbum, Siren. A mistura de trejeitos ultra-cool, típicos de um crooner com instrumental oscilando entre levadas dolentes e românticas, finalmente estava moldado a caráter. O último disco do Roxy, Avalon (1982) parece uma introdução a esse clima, levado a cabo por Boys And Girls. Ainda que os dois trabalhos sejam bastante parecidos, a qualidade das composições e arranjos tornam a audição de ambos obrigatória.

O maior sucesso de Ferry está aqui. "Slave To Love", a música que sonorizou o filme 9 1/2 Semanas de Amor, foi vulgarizada e adotada como hit moteleiro. Não é pra menos: o arranjo é uma orgia de sintetizadores, guitarras, percussões, tudo conspirando para o rito de acasalamento em sua forma mais, digamos, completa. "Don't Stop The Dance", outro grande hit, já segue a linha mais dançante, mas é igualmente lânguido e convidativo.

O trabalho posterior de Bryan Ferry, Bete Noire (1987), ficaria um degrau abaixo de Boys & Girls e iniciaria uma discreta decadência da proposta original. Aqui, neste disco, Ferry está no auge, no comando.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Beastie Boys - Paul's Boutique (1989)

O segundo disco dos Beastie Boys é o melhor que já fizeram. Muita gente pode preferir a estréia de Licensed To Ill (1986) ou Hello Nasty (1998), talvez Ill Communication (1994), mas eles jamais terão um trabalho tão legal quanto Paul's Boutique. E por que? Simples, esse é o disco mais negro do trio, é aquele momento em que seu hip-hop de branco novaiorquino encontra a maravilhosa caixa preta dos grandes mestres do soul e do funk. A produção dos Dust Brothers é primorosa, foi o trabalho que os BB gravaram em Los Angeles, logo após deixarem a Def Jam, gravadora de hip-hop famosa por lançar os primeiros artistas do estilo.

Era uma época - 1989 - em que os samplers eram quase uma novidade. A idéia de se apropriar de trechos, linhas de baixo, riffs de guitarra faria nascer monstros pouco tempo depois. Quem não lembra de Vanilla Ice chupando o baixo de "Under Pressure" (Queen e Bowie)? E de MC Hammer pilhando todo o groove de "Superfreak" (Rick James)? Pois então. A diferença é que os Beastie Boys e os Dust Brothers eram pessoas com noção e capazes de entender o signficado de inserir elementos alheios ao som que estavam criando. O disco, no entanto, não é feito só de samples. Há instrumentos reais tocando, indo de violões, cuícas, percussão e chegando nos habituais baixo, bateria, guitarras e teclados.

A abertura com "To All The Girls" mais parece uma daquelas slow jams dos anos 70, toda sampleada, tudo isso para desembocar na gritaria ancestral de "Shake Your Rump" e conectar baixos, teclados e batida com toda uma cena americana da virada dos anos 80/90, indo de guetos, praças, muros pichados, trens e metrôs perigosos.
Impossível não se espantar com os resultados obtidos em canções como "Shadrach", "What Comes Around", "Hey Ladies", "Egg Man" ou na improvisação infernal de "B-Boys Bouillabaisse"

Dá vontade de estapear todos os sujeitos que fazem hoje o que a mídia resolveu chamar de hip-hop. Saudades de 1989.

Apresentação


Sou um fã de discos. Devo ter uma grande insegurança ou incapacidade em me contentar com o aspecto imaterial da música, uma vez que preciso de CD's, LP's ou qualquer outra forma para ter a certeza que a canção (ou canções) estão ali, em meu poder. Sei muito bem que a arte (no caso da modalidade audiovisual) cutuca o nosso cérebro de uma forma distinta das esculturas, pinturas e isso é bom, mas me dói - ainda bastante - ver um mundo em que a música é algo fugidio, apenas digital e que tende mais e mais a cumprir um papel acessório na vida moderna.

Ouvir música se tornou uma tarefa que acompanha outras tarefas - mais importantes, mais sérias - e os formatos digitais atuais acabarão por sentenciar os discos ao esquecimento, pelo menos para a maioria do público. Pena, pois eles - os formatos - são práticos e o mundo perderá informação com essa condição...

Esse blog é a contribuição de um sujeito que escreve sobre música há um bom tempo e que, quase sempre, ouve mais de um disco por dia. Não faço coletâneas, não ouço rádio, deixei de ver MTV há um bom tempo, minhas informações sobre música vêm de diversas e informais fontes - todas confiáveis. Aqui pretendo todo dia falar a vocês sobre um disco que estou ouvindo ou que acabei de ouvir. Dizer o que achei, aconselhá-los ou não a fazer o mesmo e, mais que tudo, celebrar o formato de várias canções integrando um conjunto.
Os posts não seguirão formato, não serão sempre positivos e, em breve, teremos um bom arquivo. Pra essa empreitada funcionar, a participação de vocês é essencial.

Nos vemos sempre.

Carlos Eduardo Lima - CEL

PS: esse não é um blog de downloads.